Marília Pêra interpreta a anti-Susan Boyle em 'Gloriosa'

Postado por Tempero Cultural


Por Dolores Orosco


Atriz vive Florence Jenkins, cantora sem talento que virou 'a diva do grito'.Espetáculo de Claudio Botelho e Charles Möellher estreia em São Paulo.

Feia e desajeitada, a cantora escocesa Susan Boyle emocionou o mundo com sua voz de anjo no programa "Britain's got talent". Na década de 40, a americana Florence Foster Jenkins (1868-1944), moça fina de família abastada, surpreendeu o público e a crítica pelo motivo oposto: "a total ausência de talento" e a capacidade de não conseguir acertar uma única nota de uma canção.



A história curiosa desta personagem - que fez sucesso num tempo em que a febre do reality shows estava bem longe de se alastrar - é vivida pela atriz Marília Pêra, na peça "Gloriosa". Com direção de Claudio Botelho e Charles Möellher, o espetáculo entra em cartaz nesta sexta-feira (5), no teatro Procópio Ferreira, em São Paulo, depois de uma temporada de seis meses no Rio de Janeiro.

"Talvez esse seja um dos papéis mais desafiadores da minha carreira", diz a atriz, que ainda sofre para alcançar os agudos desastrosos de Florence. "Passei a vida inteira estudando para me aperfeiçoar no canto e agora tive de encontrar um jeito de desconstruí-lo no limite das minhas cordas vocais", completa Marília, que no passado interpretou a diva Maria Callas no palco.

Quem divide a cena com a atriz é a dupla Guida Vianna e Eduardo Galvão. Parceira humorística de Marília na novela "Duas caras" - elas interpretaram as madames Gioconda e Lenir na trama de Aguinaldo Silva - Guida estrela três papéis na peça. Vive Maria, a empregada de Florence, a amiga Dorothy, além de Verinda, uma professora de canto que humilha a protagonista durante um recital. "Depois da Lenir, virei a eterna dama de companhia da Marília", brinca Guida, sobre suas novas cenas com a atriz. "É uma história fascinante, chega a ser surreal e mal dá para acreditar que se trata de um fato verídico".

Eduardo Galvão interpreta o pianista gay Cosme McMoon, que se aproxima da protagonista interessado em sua fortuna, mas acaba se tornando fiel escudeiro durante dez anos. "No início o personagem sente até um certo desprezo, pois tem consciência do quanto ela é desprovida de talento. Mas aos poucos vai se afeiçoando, se penalizando por essa dedicação que a Florence tem pela música", diz Galvão.

Diva do grito

Apaixonada por música clássica e herdeira de uma família de banqueiros, Florence Foster Jenkins, tinha certeza de que era uma soprano brilhante. Organizava recitais badalados e exibia sua capacidade de massacrar clássicos de Mozart, Verdi e Strauss.

Na alta roda de Nova York, a "cantora" era chamada cinicamente de "a diva do grito". Suas performances bizarras ganharam fama, e atraíam "fãs" e famosos como Cole Porter.

Acostumada aos aplausos - ainda que jocosos - aos 76 anos ela aceitou um arriscado convite para cantar no Carnegie Hall. Diante de uma plateia de duas mil pessoas, mostrou que no peito do desafinado também bate um coração.

Ao se deparar com as críticas nos jornais do dia seguinte - um deles falava em "total ausência de talento" - entrou em depressão e, um mês depois do concerto, morreu de ataque cardíaco.

"Acredito que a Florence, apesar de cantar mal, tocava o coração das pessoas. Ela tinha uma série de fãs!", justifica Marília. "Se você observar por aí, vai ver tantos artistas sem talento, mas que continuam na mídia fazendo sucesso, vendendo milhões de discos... De alguma forma, essas pessoas conseguem emocionar o público, tem gosto para tudo".

Parceria com Lázaro Ramos

Aos 62 anos de carreira, Marília confessa já ter pensado em aposentadoria. "São muito anos, é inevitável se repetir", avalia a atriz. "Isso é um problema, pois às vezes ouço aquela vozinha dizendo: 'está na hora de parar'...". A ideia só não ganha força porque os convites não permitem.

Com "Gloriosa" em cartaz, já trabalha em outro projeto: vai dirigir e atuar na peça "Vórtice", de Noel Coward, ao lado de Lázaro Ramos. Ainda neste segundo semestre, voltará à TV no seriado "Cinquentinha", de Aguinaldo Silva, com Susana Vieira e Rentata Sorrah. Marília será uma das três viúvas de um ricaço, que tentam estabelecer um bom relacionamento - condição que o marido morto impõe no testamento para distribuir a herança.

No teatro, mantém certos hábitos que muitas vezes são entendidos como antipatia ou estrelismo. "Em dia de peça não falo absolutamente nada com ninguém, fico sozinha. Sei das minhas limitações e sou rigorosa", admite. "Nesses anos todos, aprendi a me respeitar. Sou uma atriz intuitiva, que estuda para suprir algumas deficiências e encarar o medo do palco". Em comum com sua mais recente personagem, diz ter pouco. "Gostaria mesmo é de ter essa auto-confiança da Florence, mesmo sendo um desastre no que fazia. Mas acho que sou dedicada ao meu ofício como ela foi", compara.

GLORIOSA

Onde: Teatro Procópio Ferreira - Rua Augusta, 2823, Jardins
Quando: quinta e sábado, às 21h; sexta, às 21h30 e domingo às 18h.
Em cartaz até 2 de agosto.
Ingressos: R$ 70 (quinta); R$ 80 (sexta e domingo) e R$ 90 (sábado)

Fonte:
G1

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